sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

CADERNOS DA MEMÓRIA - ENTREVISTA SIDNEY ROLAND


Sidney Roland
Artista plastico e Fotógrafo.
por Jacqueline Durans


Numa manhã de domingo, com uma luz e atmosfera especial, me encontro com Sidney Roland, o famoso "Pirambóia", apelido que recebeu ainda nos tempos do colégio. Com ele estava sua esposa Zilah, a quem ele atribui toda sua inspiração e devota o amor de sua vida.
A entrevista transcorreu como um bate papo, de modo natural, com todo o seu cavalheirismo e bom humor peculiar, Sidney respondeu as nossas perguntas. Através de suas respostas, observações e memórias, consigo traçar um recorte cultural e econômico de momentos especiais em nosso Pais.São retratos de um tempo onde o comum era um homem ter palavra e a grandeza estava em manter a honra do seu nome, mantendo-se virtuoso em seu caráter, mesmo que isso lhe causasse perdas financeiras.
Sidney Camargo Roland, nasceu em 24 de novembro de 1935, na cidade de Limeira, interior Paulista, filho de Lenyra Sampaio Camargo Roland e Ary Roland, que ele orgulhosamente declara que os dois possuíam habilidades artísticas. Lenyra, sua mãe formou-se normalista na primeira turma do Colégio São Jose, onde na época já havia na grade curricular aulas de pintura.
Seu Ary era santista e veio para Limeira trabalhar no Banco do Comércio e da Industria de São Paulo, e só não seguiu carreira como pintor, porque a família não permitiu na época.
Já sua mãe a professora Lenyra pode seguir seu talento e junto com seu primo - Osvaldo Gonçalves - que era professor de caligrafia no Colégio Santo Antonio. A escola/atelier, funcionava num sobrado na esquina da rua Dr. Trajano com a rua Santa Cruz.


JD - Qual a formação acadêmica do senhor?
Sidney - Inciei minha alfabetização no Grupo Escolar Coronel Flaminio Ferreira, onde minha mãe também estudou e posteriormente lecionou. Depois entrei no Colégio Castelo Branco e em setembro de 1955, antes que terminasse o terceiro ano do ginásio, entrei na Escola Varig de Aeronáutica, localizada em Porto Alegre para participar do curso de mecânico de aeronaves, que era meu grande sonho na época. A caráter de informação, um ano após minha entrada no curso, a escola foi reconhecida por sua qualidade e estabeleceu uma parceria com o SENAI, passando então a ser chamada de Escola SENAI Varig.


JD - O senhor chegou a terminar o curso?
Sidney - Me formei em 1957 e seis meses depois já trabalhando na área, houve uma grande greve dos aeroviários em todo Brasil, eu era o mais novo da equipe, e como todos aderiram a greve, acreditei que deveria apoiar os colegas. Rubem Berta (Presidente da Varig), não admitiu a possibilidade de greve na empresa, motivo pelo qual demitiu todos os que integraram o movimento, inclusive eu. Nesse dia, 23 de dezembro de 1957, eu vi interrompido meu grande sonho de estar a bordo de um "Constellation" como "Fly engineer".


JD - O que o senhor fez após este corte em seus planos?
Sidney - Primeiro fui para São Paulo tentar outras companhias de aviação, mas o mercado estava saturado de profissionais, então decidi ir para o Rio de Janeiro. Como no Rio também não consegui arrumar trabalho na área, busquei novos caminhos. Trabalhei como vendedor de maquinas de escrever na Remington, vendi automóveis na Cirpan, até ser contratado como vendedor da Fininvest, onde cheguei a ser gerente de vendas. Na Fininvest permaneci até ser criado o Banco Nacional da Habitação, o que propiciou o surgimento de empresas que ofereciam crédito imobiliário. Foi quando fui convidado para criar e desenvolver o departamento de vendas da Letra S.A. Crédito Imobiliário e posteriormente recebi uma proposta da Corretora Almeida e Silva, uma das mais tradicionais corretoras da Bolsa de Valores do Rio de Janeiro.


JD - Quanto tempo o senhor trabalhou no mercado de capitais?
Sidney - Até 1972, quando a bolsa de valores despencou. Para se ter uma ideia da desvalorização que esta quebra causou,  uma ação do Banco do Brasil que valia até a data dezessete cruzeiros, passou de uma hora para outra a valer  dois cruzeiros.


JD - E como este crash financeiro afetou sua carreira, ou melhor sua vida?
Sidney - Eu fiquei desesperado. Pessoalmente também sofri uma perda financeira significativa, de tal modo que tive que mudar radicalmente de ramo, e tornei-me comerciante, junto com um sócio abrimos um pet shop na Ilha do Governador. Depois que a situação foi melhorando, conseguimos abrir uma filial da loja no centro do Rio.


JD - Quando a arte começa a fazer parte efetivamente de sua vida?
Sidney - Através de uma brincadeira com Zilah, na época minha  noiva. Fomos juntos ver uma exposição na Galeria Bonino em Copacabana, do Iberê Camargo, que na época eu desconhecia totalmente seu trabalho. Ao ver as obras do artista, virei para Zilah e lhe disse: - Ah, isso ai eu faço (quanta pretensão eu tive naquele dia! rs). E Zilah, topou o desafio, me deu alguns tubos de tinta que possuía da época em que estudava e terminou dizendo que queria ver se eu fazia mesmo.
E foi assim que eu pintei a minha primeira tela, Zilah viu o resultado, gostou tanto que prometeu que quando tivéssemos a nossa casa, iria coloca-la numa moldura e pendurar na parede da sala. E assim aconteceu, quando nos casamos Zilah emoldurou a tela e realmente ela  a pendurou na parede de nossa sala, cumprindo então sua promessa. Curiosamente na casa de molduras, nomearam minha tela como "Sonho infantil".


JD - Alguém o influenciou ou estimulou o senhor a continuar pintando?
Sidney -Um grande amigo e talentoso pintor sacro, o Mario Mendonça. Em 1970, decidi dar a Zilah de presente de aniversario de casamento, uma tela do Mario, e a escolhida foi a que representava a primeira queda de Cristo a caminho da Via Crúcis. Mario prometeu emoldura-la e gentilmente se ofereceu para nos ajudar a escolher o melhor lugar para sua obra em nossa casa e pendura-la. Ao entrar em nossa sala ele notou o "Sonho infantil" e perguntou se era de um artista tal, que eu desconhecia. Rindo lhe contei toda a história da pequena tela e que a mesma eu que havia pintado. Ele então disse que eu devia estudar e continuar a pintar. Um dia sem aviso prévio, passou em casa para me apanhar, e sem explicações de onde iriamos, me levou a uma loja que vendia materiais para pintura, lá começou a separar uma série de itens, que me entregou dizendo: - Agora é só pagar e começar a pintar.    


JD - Houve algum professor importante para sua formação enquanto artista? 
Sidney - Por indicação do Mario, comecei a fazer aulas com o antigo professor dele, Aluisio Carvão. Quando conheci o Carvão me lembro bem de ter pedido que me ensinasse a desenhar, para que quando eu colocasse um nariz na orelha seria porque foi assim que imaginei. Foram dois anos de aprendizado, todos dias logo de manhã eu passava na casa dele em Copacabana e dali seguíamos para o Jardim Botânico até o seu atelier, onde eu permanecia pintando embaixo de uma bela arvore até às nove horas, quando então ia para a corretora, pois o pregão da bolsa começava às nove horas e trinta minutos.  


JD - Durante sua formação artística houve outros professores significantes? 
Sidney - A convite de um amigo, Joaquim Costa e Pinto - na época diretor da Casa Brasil Madrid - eu e Zilah viajamos para a Europa, onde permanecemos durante quatro meses e meio, e  durante dois meses que passamos em Madrid tive a oportunidade de estudar na Escola de Belas Artes São Fernando. Quando voltamos ao Brasil, me inscrevi em alguns cursos na  Escola de Artes do Parque Lage, eu gostava muito de estudar lá, de estar lá naquele momento, eram os anos oitenta. Foi também neste espaço querido que vivi uma situação bastante ambivalente, um dia ao chegar para a aula encontrei as portas da escola fechadas e descobri que não haveria aula porque estava sendo montada a que mais tarde ficou famosa como a exposição da "Geração 80" - movimento de retorno a arte pictórica, e sobre a qual eu e outro colega nada sabíamos. Indignado liguei para o diretor da escola e lhe falei sobre o quanto estava me sentindo órfão de mãe e de pai. O diretor na época alegou não estar ciente dos procedimentos e pediu-me desculpas. Passada a famosa exposição, eu e o Jaime Fernando (o outro aluno), fomos convidados a expor na PUC pelo tal diretor. Depois houve também uma homenagem ao professor e pintor Luiz Aquila no Parque Lage, e também fomos convidados (eu e o Jaime) e apesar de ainda me sentir magoado, passei por cima dos meus ressentimentos e topei participar da exposição. Depois deste fato na Escola do Parque Laje, só voltei a pegar num pincel quando retornei para Limeira em 1996.

JD - O senhor possui algum artista que influenciou esteticamente ou conceitualmente seu trabalho, ou então existe algum artista do qual goste muito?
Sidney - Influência não digo que sofri, mas sinto grande admiração por alguns artistas como Picasso, Paul Klee, Matisse, Lautrec e os brasileiros Mario Mendonça, Aluisio Carvão, Guignard, Anita Mafalti, Pancetti, Milton Dacosta entre outros.  

JD - Como o senhor administra sua relação com a arte?
Sidney - Sempre gostei de arte e sempre fiz porque me faz bem. Eu, nunca me preocupei em ser um artista profissional, optei sempre pela liberdade criadora. Permito-me experimentar sempre o novo e manter-me em estado de aprendiz, tramitando pelos diversos seguimentos das artes visuais.


JD - Depois de tantas "andanças, experiencias", como o senhor mesmo disse, consegue chegar a alguma conclusão sobre si mesmo, sobre a vida? 
Sidney - Acho que sou uma pessoa peculiar, com pavio curto para bobagens. Em compensação, nos momentos mais difíceis, sempre mantive o olhar no horizonte, de modo otimista, sonhador e acreditando que tudo pode dar certo.
Confesso que ainda carrego uma dor de cotovelo por não conseguido alcançar minha meta de ser um "Fly engineer" na Varig. Ainda hoje quando ouço o ronco do motor de um avião, sinto nostalgia. Foi marcante este momento de minha vida, que apesar de tudo, desde que fizemos vinte e cindo anos de formados, eu a turma classe que me formei, nos encontramos para uma confraternização da MG5 (quinta turma de Mecânicos Gerais da Varig).
Mas, se esta fase de minha vida tivesse dado certo, talvez eu não teria ido para o Rio de Janeiro, e conhecido aquela que ha quarenta e dois anos é minha melhor amiga, incentivadora, companheira, esposa e musa, a grande paixão da minha vida, Zilah.






















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